Não há uma perfeita identidade e equivalência entre os conceitos de esquerda, marxismo e socialismo. A noção política de esquerda é anterior ao marxismo, e a categoria socialismo não se esgota no marxismo.
A raiz histórica e filosófica da categoria esquerda é Iluminista e, portanto, intimamente relacionada com a Revolução Francesa. Além disso, a dualidade moderna direita e esquerda representa, até certo ponto, uma secularização e horizontalização da dicotomia vertical Deus - Homem, ou melhor, expressa o triunfo de uma perspectiva laica e naturalista da ordem política que, cabe sublinhar, contrasta com a fundamentação religiosa e a legitimação vertical presente nas sociedades tradicionais.
Em suma, a oposição direita e esquerda é uma tradução laica e “horizontal” da legitimação vertical alto e baixo, céu e terra, e Deus e Homem existente nas sociedades do Antigo Regime.
Existem importantes distinções teóricas e práticas entre o socialismo marxista "ortodoxo" e a nova esquerda desconstrucionista. Enquanto o comunismo pretendia instaurar uma revolução tendo em vista o surgimento de uma nova ordem social e política - uma sociedade igualitária sem distinções de classe, pobreza e miséria - , a nova esquerda de Marcuse, Foucault, Deleuze, Derrida e Butler busca, por meio de uma crítica corrosiva e de um puro pensamento negativo, a mera destruição de todos os valores, que, fatalmente, culminará em um niilismo anárquico e desintegrador.
Ao invés do projeto revolucionário de construção de uma sociedade futura, há um anseio de retorno ao primitivo, a um estágio caótico; uma espécie de mergulho no abismo do nada. O espírito da nova esquerda é essencialmente dissolvente, líquido, e, deste modo, similar à mentalidade pós-moderna. Por sua vez, no marxismo clássico existe uma orientação em relação ao porvir e uma dialética de renovação e progresso que é algo próprio da modernidade sólida.
Indubitavelmente, a nova esquerda deixou de ser a vanguarda do proletariado transfigurando-se em linha de frente dos interesses do grande capital e dos anseios das oligarquias mundialistas. Abandonou a classe trabalhadora e o povo, abraçando com entusiasmo juvenil valores e bandeiras próprias da burguesia cosmopolita. Ao ridicularizar e desconstruir o senso comum e os valores “conservadores” da grande maioria do povo tornou-se "elitista", esnobe e mundana. Seu discurso puramente ideológico, descolado da realidade e das preocupações concretas das pessoas comuns, conquista apenas parcelas inexpressivas e ínfimas da população. De partido do povo e dos operários se transformou em caixa de ressonância cultural do partido do supercapitalismo global.
Neste sentido, há uma perfeita simbiose e convergência de interesses entre a agenda "libertária e antitradicional" da esquerda pós-moderna e as ambições de controle psicológico e domínio político e econômico por parte da superclasse mundial. Ao atacar e enfraquecer - de modo indireto ou frontalmente e por diversos meios - a religião cristã, a tradição, a moral natural, a cultura humanista clássica, a família, a autoridade dos pais e o patriotismo, a nova esquerda cosmopolita cumpre à risca o multissecular projeto destrutivo e contracultural da revolução mundial anticristã.
A paixão e o culto por parte da “nova esquerda” das mudanças sociais radicais, das transformações culturais bruscas, e das rupturas e inovações permanentes faz dela uma fiel aliada do seu pretenso inimigo mortal: o capitalismo liberal globalizado.
É preciso sempre recordar e salientar que, ao contrário de certa apologética ainda em voga, o grande capital nada tem de conservador e “reacionário”, pouco se importando em proteger tradições espirituais, costumes ancestrais e culturas milenares. A dinâmica do supercapitalismo financeiro mundial é explicitamente contrária ao “espírito de conservação do ser”, e ao cultivo dos valores da permanência, estabilidade e solidez.
O projeto moderno de uma “obsolescência programada” de todas as coisas e princípios irmana revolucionários e plutocratas. Desta forma, entre a esquerda libertária pós-moderna e a "direita econômica" liberal-capitalista os pontos de contato, as convergências doutrinárias e as conexões sutis em termos estratégicos e práticos são imensas. Há uma relação de vasos comunicantes entre elas. Ao lançar-se com tenacidade contra todos os limites sociais e normas morais tradicionais a esquerda pós-marxista e libertária cumpre um papel essencial para a consolidação e afirmação de um tipo humano caracterizado pela imaturidade, instabilidade emocional e pela busca permanente de prazeres e aventuras anestesiantes. Um tipo antropológico sedento de novidades e sensações intensas. Ora, este indivíduo fragmentado e impulsivo, sem referências sólidas e laços orgânicos é justamente o modelo humano que o grande capital e as forças anônimas do mercado sem peias almejam criar e consolidar a fim de sustentar e fortalecer uma cultura consumista, voltada unicamente para a satisfação dos desejos imediatos e para a aquisição compulsiva de bens e mercadorias de todo tipo. O livre mercado, o livre consumo e a flexibilização e liberalização dos costumes formam uma tríade inseparável. A figura do eterno jovem rebelde é altamente lucrativa. É um símbolo para a indústria cultural e para os mecanismos de propaganda e publicidade. Em contrapartida, a imagem de um indivíduo "careta e quadrado", religioso, patriota e firme em suas convicções não é de modo algum rentável e é pouco atrativa em termos publicitários. O capitalismo globalizado necessita e favorece as forças antitradicionais e desintegradoras que, resumidamente, possibilitam o surgimento de um "homem light" e de sociedades abertas, sem fronteiras físicas e morais.
A nova esquerda e as oligarquias cosmopolitas em sua luta obstinada e persistente contra todas as formas de “repressão” e, portanto, em sua faina pela liberação dos instintos e dos desejos buscam, em última instância, destruir o próprio logos entendido em seu sentido clássico e cristão. A logofobia e a cristofobia são as forças propulsoras da revolução mundial.
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